Espiral #64: Dando o pontapé inicial em 2023
Astrologia, "Dry January", Julia Cameron, Japanese Breakfast
Trilha sonora para esta newsletter: La Question, de Françoise Hardy, que indiquei na oitava #Espiral, uma edição que gostei muito de escrever.
Começando 2023 abrindo a caixa de pandora
Começar o ano em Berlim me trouxe outra perspectiva para ele. Fiquei chocada com a quantidade de fogos que queimam nesta cidade. Chega a ser assustador, especialmente porque a garotada adora apavorar idosos como eu jogando fogos na gente.
O inverno não está rigoroso, mas os dias continuam mais curtos do que os ensolarados e intermináveis, que nos enchem de energia no verão e nos faz querer ficar na rua. Esses, eu entendo agora, são magníficos e raros, por isso é necessário abraça-los tão forte.
Eu me dei conta de que, mesmo neste período introspectivo do ano, eu não tenho tido tempo livre para o ócio, aquele, o criativo. Entro no banho e conecto um podcast - tenho até uma caixa de som no banheiro para facilitar a minha escuta que é debilitada. Sento no sofá e abro um livro ou ligo a TV. Deito na cama e leio no Kindle. Enquanto eu como, eu scrollo a tela do celular ou leio alguma revista. Coloque aí pausas para namorar, atividade que também exige atenção.
Fiquei buscando na memória quais são os meus momentos de desconexão. Pois bem, eles acontecem em quatro momentos, sendo que os dois primeiros eu não tenho tido: Pedalando, caminhando, cozinhando ou dormindo.
Decidi não ouvir música na primeira semana do ano. Eu amo música, veja bem, mas estou passiva na escuta. Só entra música nos meus ouvidos se o Ola, ou alguém que estiver no lugar onde estou, colocá-la para tocar. Caso contrário eu optei pelo silêncio, aquele que eu geralmente não tenho. Na real o silêncio total eu nunca terei, porque o meu é prejudicado por um zumbido eterno no ouvido.
Certa vez, um fã perguntou ao Nick Cave se ele sofria de zumbido no ouvido. Eu me senti representada por ela na resposta, já que pareceu falar sobre o mesmo grilo que mora em mim. Cave disse que zumbido é a maldição do músico. No meu caso, foi também a música que me levou a este campo aflitivo de grilos onde eu vivo. Discotequei por anos sem proteger os meus ouvidos adequadamente, por isso eu recomendo: Nunca deixe de usar protetor de ouvido em lugares barulhentos. Eu continuo esquecendo os meus.
Você escuta bem? Como é o seu silêncio?
Essa busca pelo silêncio tem me feito sonhar com uma casinha no sopé de uma montanha com nada para fazer em volta além de abraçar a natureza. Poder dormir e acordar cedo, passar o dia entre a leitura e a escrita, ouvir meus discos, assistir séries e filmes, comer pipoca e tomar café e ficar sem fazer absolutamente nada. Pela primeira vez eu não quero praia, eu não quero os amigos em volta. Nem mesmo a minha ausência no próximo carnaval tem me causado siricutico. Eu quero um pouco de solidão, como se fosse ela a responsável por me ajudar a voltar para o eixo que anda bambo.
De vez em quando você se sente assim?
Sol em Gêmeos: Vou me dar bem em 2023?
Não sou uma pessoa mística, mas nos últimos dias eu tenho buscado uma luz na astrologia e no tarô. As respostas, muitas vezes ocultas, estão onde procuramos. Não encontrei novidades, mas frases que têm martelado na minha cabeça e que eu deveria escrever todas à mão e colá-las no espelho para que eu lembre delas todos os dias.
“Para se sentir livre e leve, você precisa desapegar de situações do passado e pesos que sequer são seus. Isso pode ter a ver com a maneira com que você encara suas relações e o que você busca em outras pessoas. […] Você precisa fortalecer sua autoconfiança e recuperar sua individualidade mais autêntica. Isso vai fazer bem para você e suas relações. No fim do mês as coisas tendem a estar beeem mais claras. Faz bem focar no descanso, em leituras e em tudo o que te ajude a entender sua situação, seu contexto e suas possibilidades.” - Previsão para Gêmeos em janeiro na Elle
Na previsão da Refinery29, o pedido é que eu terei que fazer mudanças consideráveis porque o ano me traz um novo início na minha carreira profissional. Tcharãm! Para onde estou indo?
Já no tarô eu tenho sido perseguida pela carta do Imperador, que pede para enxergar a importância de reconhecer a própria força e não depender demais de ninguém. Bingo!
Se alguém entende dos assuntos e quiser me dar dicas extras, serei grata. :)
Nós ainda acreditamos em tendências?
Enquanto eu me debruçava nos relatórios de tendências para vislumbrar o que o novo ano nos reserva, eu resgatei este ótimo artigo sobre a morte delas. A autora, Terry Nguyen, discorre sobre em como a todo momento uma “nova tendência” surge no TikTok, mas que, no geral, é desconectada de qualquer movimento. Estas (ditas) tendências geralmente estão conectadas apenas à estética digital. Está cada vez mais difícil discernir o que é uma tendência e o que é apenas uma observação que se tornou viral mas que não vai dar em nada.
O fim das tendências tem sido arduamente debatido, afinal “a cultura foi descentralizada. O centro, o mainstream, morreu”.
“Graças à Internet e às suas numerosas redes de influência, os produtos de todas as categorias são agora mais suscetíveis às tendências do que às preferências individuais. Um programa se torna popular porque muitas pessoas o assistem, e é perfeitamente possível que uma grande parte do público do programa o faça não porque reflete seus interesses ou valores, mas porque todo mundo que eles conhecem estão assistindo a um programa e as pessoas não querem ficar de fora.” - Ana Andjelic
Ou seja, o foco hoje está mais nas comunidades e menos no indivíduo. De qualquer forma, como sabemos, há movimentos que surgem e viram uma tendência. Vou falar sobre uma que me interessa bastante no momento:
Lifestyle não-alcóolico e a cultura do bem-estar
Depois da esbórnia que começou nas celebrações da firma, nos encontros com os amigos no fim do ano, no Natal e na festa de virada de Ano Novo, muitas pessoas se entregaram a um detox do álcool. Eu e o Ola aderimos a ele numa campanha intitulada “Janeiro Seco” que, em Berlim, tem ganhado muitos adeptos, inclusive com restaurantes estrelados Michelin oferecendo carta de “vinhos” e coquetéis não-alcóolicos para os que gostam de ter uma taça ao lado acompanhando a comida.
Ontem, eu fui celebrar o aniversário do Ola num restaurante badalado que serve apenas menu degustação. Tanto o menu de aperitivos quanto a carta de vinhos ofereciam opções não-alcóolicas. Nós tomamos duas taças de “vinho” branco, um de origem norueguesa e outro, dinamarquês. Ambos deliciosos, refrescantes, secos e diferentes. O primeiro tinha uma nota amadeirada tão acentuada, que quando eu levava a taça à boca, eu me sentia entrando numa loja da Aesop. Saí embriagada.
Entrando nesta onda de crescimento de pessoas consumindo menos álcool, temos um späti* em Berlim que vende apenas bebidas não-alcóolicas, incluindo gin, uísque, cerveja, aperol, etc., e o The Mindful Drinking Club é uma dessas lojas chiques de vinho, mas dedicada às bebidas não-alcóolicas (e aos vinhos naturais).
Diversas campanhas foram lançadas mundo afora para ajudar os consumidores a lidar bem com o “Janeiro Seco”. E, esta indústria de não-alcóolicos, que não são refrigerantes e nem kombucha, tende a crescer bastante nos próximos anos, em especial com a GenZ, a geração que menos consome álcool, já frequentando bares. Nos Estados Unidos, entre agosto 2021 e agosto de 2022 foram movimentados US$ 395 milhões de vendas de drinks não-alcóolicos, mostrando um crescimento de 20,6% ao ano. É bastante coisa e só tende a aumentar.
Seguindo esse movimento, o bar 0% Non Alcholic Bar Experience, em Tóquio, oferece apenas drinks sem álcool e comida vegana, enquanto o Daybreaker é um projeto que promove festas onde a entrada de álcool é vetada. Em NYC e Los Angeles, o Boisson oferece uma vasta lista de drinks e vinhos sem álcool, inclusive promovem eventos de degustação em suas lojas.
O aplicativo Bumble detectou que 39% de seus usuários se identificam como “sober curious”, o que os levaram a criar o selo “sober” para colocar no perfil.
O MISERY é um iniciativa, de Londres, focada nas comunidades queer e BIPOC com eventos e festas sem álcool, além de fomentar discussões sobre saúde mental e cura para esse público.
A abstinência alcóolica está diretamente conectada à cultura do bem-estar, pois quando decidimos beber menos álcool, estamos pensando no efeito que ele tem na nossa saúde, em como interfere no nosso sono, humor, disposição, etc. Com a nossa expectativa de vida cada vez mais alta, precisamos nos preocupar como chegaremos lá. Se este estudo estiver certo, em 2100 nós humanos viveremos em média 126 anos. Eu sofro só de pensar que posso chegar aos 80.
Como a Renata Simões me disse “fazemos exercício físico não é para a bunda ficar gostosa, é para conseguir amarrar o tênis sozinha”.
*Späti é uma loja de conveniência de bebidas e cigarros que fica aberta até tarde.
Before leaving….
Seguem algumas recomendações de leituras e convites à reflexões para começar o ano com chave de ouro:
📕 “As prantos no mercado”, de Michelle Zeuner, aka Japanese Breakfast. O livro conta uma história de culinária afetiva e de luto da autora, que perdeu a mãe precocemente em decorrência de um câncer em 2014. A relação conturbada que as duas tinham onde a comida era o elo de afeto é narrada de maneira intensa. Foi minha primeira leitura do ano e uma porrada no meio da minha fuça. Se você não estiver bem emocionalmente, eu recomendo deixá-lo para outra hora.
🎥 “Aftersun”, filme profundamente melancólico e lindo sobre lembranças. A história se passa numa viagem de férias feita entre pai e filha para a Turquia na época em que ela entrava na puberdade. Não acontece muita coisa, não há eventos dramáticos e não sabemos muita coisa a respeito dos personagens, ainda assim é tocante e tem uma fotografia lindíssima. O Paul Mescal (Normal People) atua de maneira primorosa.
✍️ A Julia Cameron, autora do “Caminho do Artista” está lançando no próximo dia 10 o livro “Write for Life”, um programa de seis semanas projetado para ajudar os escritores a cultivar a escrita e terminar o que quer que estejam procrastinando, seja um romance ou roteiro.
✈️ Uma lista com 17 exposições que valem a viagem para a Europa este ano.
❤️ A Patti Smith conta aqui e aqui sobre seus processos criativos e referências.
🎧 O álbum bem experimentalzão “¡Ay!”, da Lucretia Dalt, que tem sido minha trilha sonora para meditar.
🔮 Esta trilha conta com várias palestras e masterclasses sobre a arte de analisar o futuro.
Feliz ano novo! E conto com a participação de vocês na minha pesquisa para deixar a Espiral muito melhor.
*Se você é novo/nova por aqui, me dê um alô para contar como me achou, quem é você, onde está, deixe suas críticas, dicas e sugestões. E, se gosta da newsletter, envie ela para os amigos.
Ainda não terminei de ler, mas não consegui me segurar em vir aqui te dizer sobre a primeira parte: você JÁ chegou lá, viu? Seu trabalho é incrível! Claro que sempre teremos trabalho a fazer, mas não sinta que ainda te falta algo antes de profissionalizar/monetizar, vai fundo!
Gente, a Lalai explorando astrologia, amei!
Posso dizer uma coisa? Ao invés de focar sempre em Gêmeos, dá uma lida sempre no seu signo ascendente, ele é extremamente importante. Dá uma olhada num dos meus sites favoritos de astrologia, que está levando meu conhecimento no tópico pra outro nível: https://www.astro-seek.com/. Aí você sabe seu ascendente, e consegue ler os trânsitos do ano, que são muito importantes para ter uma ideia do que está favorável (em que casa Júpiter está presente), e onde tem oportunidades para desenvolver (onde Saturno está presente). Plutão, o planeta de tremenda transformação, depois de mais de 20 anos em Capricórnio move o pezinho em Aquário por uns meses, então ver onde Plutão está no seu mapa é bem interessante para 2023. Eu adoro a Susan Miller também: https://www.astrologyzone.com/, então favorita pra acompanhar as previsões.
E quanta exposição boa em Londres pra 2023, né? Começa a temporada de cultura!
p.s.: eu já tinha participado da sua pesquisa desde dezembro, se ajudar. ;)
Feliz 2023! x