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Trilha sonora para esta edição: Radical Romantics, do Fever Ray, uma das bandas que mais quero ver no Sónar.
Olá!
Estou em Barcelona neste momento. Dois motivos me trouxeram até este cantinho europeu ensolarado quase o ano todo: O Sónar, um dos meus festivais de música favorito, e para conhecer a Lena, a mais nova integrante da família de uma grande amiga. Esta edição vai ser mais curtinha e sobre uma das coisas que mais gosto de fazer: Dormir.
Apesar do tópico, a última coisa em que estou pensando sobre esta viagem é que terei agradáveis noites de sono. Sempre que venho ao Sónar, eu volto só o pau da placa para casa, pedindo arrego e uma semana de férias, o que nunca acontece. Quem consegue férias depois das férias?
Li recentemente um artigo sobre o crescimento da onda do turismo para dormir, resultado do esgotamento que atingiu quase metade da população mundial após a pandemia. E, quem pode, está pagando para viajar em busca de noites de paz e bons sonhos. Mas a sofrência global com a insônia vem de longa data. A policrise pela qual a humanidade está passando, ocasionada pelas crises econômica, ambiental e geopolítica, tem também impactado a nossa qualidade de vida e, em especial, a do no nosso sono.
Dei uma espiada no WGSN que, coincidentemente, lançou na semana passada um relatório sobre a nova onda do turismo do sono:
“[…] existem 33 milhões de visualizações no TikTok para #SleepHygiene, discutindo dicas e hábitos para um sono melhor. À medida que o sono, o descanso e o "desligamento" se tornarão um foco maior relacionado ao bem-estar em 2025, várias marcas de viagem estão abrindo caminho para o turismo do sono ou experiências de viagem que têm o sono como foco e permitem que os consumidores tenham um melhor descanso. Desde comodidades no quarto e experiências restauradoras estilo retiro até ferramentas digitais que transportam os espectadores para estados de sono, exploramos o surgimento desse movimento de viagem que está ganhando força e oferecendo às marcas novas oportunidades de atrair consumidores cansados.” - WGSN, Sleep Tourism
A maioria das pessoas que eu conheço precisa de ajuda química para dormir. Há anos os meus pais não embalam numa boa noite de sono sem antes engolirem um Zolpidem. Sorte a minha que sempre dormi bem e, por ora, continuo sendo uma profissional do sono. Porém, não é como outrora. Hoje em dia é raro eu ficar na cama por mais do que 8 horas, mas essas são suficientes para recarregar o cérebro e repor a energia diária. Para a minha sorte, sou casada com alguém que também não tem problemas para dormir, mas sou eu quem ostenta o troféu dorminhoca da família.
Sempre fui a pessoa que adora cochilar à tarde. Nos anos em que eu produzi festas, eu sempre dormia pelo menos 1 hora antes de abrir a pista. Era restaurador. Sempre gostei da cultura da siesta e sou adepta à ela quando viajo para esquiar, por exemplo. Chego em casa, tomo banho, como e tiro uma fantástica cochilada de pelo menos 40 minutos. Sou também uma cochiladora profissional.
Esta pesquisa, feita com mais de 10 mil trabalhadores, apontou que 42% dos entrevistados estão esgotados. O número é ainda maior no grupo de mulheres, 46%, e também no grupo de pessoas com menos de 30 anos, 48%. A Geração Z está cansada.
Uma amiga teve um burn out durante a pandemia, culminando em um episódio de dissociação. Isso levou a sua internação em um hospital psiquiátrico em Berlim, onde ela passou dez dias sob cuidados médicos. Por lá, ela se deparou com muitas mulheres internadas por burn out. Em comum? Todas trabalhando remotamente de casa acompanhadas de filhos pequenos. Ela contou que algumas dessas mulheres escondiam a melhora no estado de saúde para poderem “descansar” mais alguns dias no hospital.
A insônia movimenta um mercado global de US$ 5 bilhões e não há indícios de recuo. A previsão é que alcance US$ 6 bilhões até 2028. Ou seja, a humanidade continuará enfrentando problemas para dormir. Este especial enumera diversos destinos para quem quer dormir nas férias. O Park Hyatt, de Nova York, por exemplo, dedica seis de suas suítes para insones, com camas que possuem colchões inteligentes e programas específicos, que prometem o sonhado sono restaurador. Esses colchões têm 90 almofadas, que se adaptam ao corpo do usuário, determinam o clima perfeito e fornecem estatísticas do sono. Tudo com uso de inteligência artificial.
Já a marca mais cara de colchões do mundo, a sueca Hästens, que tem um de seus modelos custando US$ 390 mil (o Drake é um dos que possui um desses em casa), aproveitou a ávida busca por descanso e abriu um spa dedicado ao sono, em Coimbra, Portugal. Agora é possível experimentar o colchão milionário sem pagar tanto por ele.
Estão sendo criados verdadeiros retiros para dormir ao redor do mundo, muitos deles com pacotes de uma semana, prometendo ensinar ao viajante o caminho para alcançar o nirvana no sono. Yoga, meditação, consultas médicas, coaching, alimentação balanceada e desconexão são alguns dos programas do retiro. Alguns lugares mais restritos sequer oferecem TV no quarto por considerá-la mera distração.
O máximo de luxo que eu tive à mão num hotel foi me deparar com um extenso menu de travesseiros. Escolher um, porém, não foi uma tarefa fácil, já que eu durmo bem até com almofada.
Atualmente diversos hotéis de luxo ao redor do mundo já têm um “concierge de sono” e estão contratando pesquisadores do sono com a missão de transformarem os seus quartos em verdadeiros santuários para dormir.
Em 2019, eu passei 8 dias no Rituaali, em Penedo, um spa com uma programação focada em relaxamento e reeducação alimentar. Fiquei 8 dias numa dieta vegana e sem álcool, cafeína e açúcar, além de ter me esbaldado com tratamentos corporais, saunas, acompanhamento médico e um personal trainer me acompanhando nos exercícios físicos. Eu nunca dormi tão bem como por lá, pois tudo era feito sob medida para prover uma noite de sono 5 estrelas. A internet não funcionava nos quartos e às 22h eu já estava dando as mãos para o Sandman. Quando voltei para São Paulo, eu estava num estado de êxtase tão maravilhoso provando as maravilhas que noites bem dormidas, boa alimentação e cuidados com o corpo fazem. Eu recomendo!
Poucas vezes eu me senti tão bem e plena, por isso, mesmo não tendo problemas para dormir, eu não tenho dúvidas de que uma viagem para dormir pode provocar uma mudança radical na vida de alguns.
Vivendo numa sociedade do desempenho, a maioria de nós sente culpa quando dorme muito, mas sorte de quem consegue fazê-lo sem grande esforço. Os espaços dedicados ao sono estão também se estendendo aos lounges em aeroportos. Recentemente, eu fiz uma escala de 4 horas em Amsterdã e me deparei com o lounge da KLM totalmente renovado, com uma área dedicada para dormir, além de banheiros com ducha a la Niagara Falls. Tomei um banho e, para dar um up na cara cansada depois de 12 horas voando, eu dormi por duas horas. Voltei para casa nova como se tivesse voado de classe executiva.
Caso você tenha se animado para fazer uma viagem para dormir, mas não tem como desembolsar todo esse dinheiro, este artigo dá uma ótima dica para viajar com budget mais pé no chão: Se hospedar em monastérios e/ou conventos, que sempre garantem estadias tranquilas e são comuns na Espanha e Itália.
Nesta entrevista com a Ottessa Moshfegh, autora de “Meu ano de descanso e relaxamento” - livro que eu recomendo bastante a leitura -, ela responde à pergunta “Por que se investe tanto na indústria do sono?” da seguinte forma:
“O capitalismo vai tentar lucrar com o sono porque é algo necessário para a sobrevivência. Todo mundo faz isso. E é uma questão muito emocional, as pessoas vão investir em qualquer coisa que possa significar um sono melhor.”
Como vemos, o capitalismo já está lucrando faz tempo com o sono e pretende lucrar ainda mais.
E você, como está seu sono?
Sleep 😴
🛌 Melhores lugares para tirar férias para dormir.
💤 Dormir é o nosso super-poder.
👩🏻❤️👨🏻 Após 30 anos juntos, dormir é o novo fazer sexo, por David Sedaris.
🪩 Rick Owens quer que você tire uma soneca na “rave”.
🧑🏻💼 Coach do sono.
⚫ Nunca mais eu vou dormir: Black Mirror voltou!
📚 Estou lendo “Porque dormimos”, de Mathew Walker.
🎥 Estou assistindo a série “Entre Estranhos”, na Apple TV.
🎧 Estou ouvindo “Myuthafoo”, o novo álbum da Caterina Barbieri.
🗞 Elas querem salvar a mídia indie com uma bela revista digital, mas estão causando barulho porque não vão pagar nada para os colaboradores e um deles tem apenas 12 anos.
Bom fim de semana! Por aqui, a maratona já começou e dormir bem só na semana que vem.
amo dormir. e o livro do walker é maravilhoso. 😽
Eu amooo esse tema. Tem aquele livro (que não li mais quero) do Capitatalismo Tardio e os Fins do Sono, que coloca uma outra camada ligada a aprendizado, consumo, produtividade e mil fronteiras do sono que estamos prestes a quebrar. Morro de medo.
Nos últimos meses meu sono tem sido ótimo, um milagre, ainda que eu me sinta um pouco cansada durante o dia e com a sensação de que dormi pouco. Mas quando deito não tenho a mínima dificuldade, entro num grau profundo em minutos - só que nunca lembro de sonhos. Aquele momento oversharing pq aqui tô bem em casa kkk
Beijos!